segunda-feira, 22 de julho de 2013

LEMBRETE

Peço que tenhamos em mente as armadilhas que nossos sentimentos e pensamentos solitários ou comungados parcialmente podem provocar, quando alimentados pelas nossas idiossincrasias, gostos e opiniões pessoais. Procurem lembrar que relações são alimentadas, para o bem ou para o mal, baseando-se em níveis de rejeição ou aprovação. O tal: isso me faz bem/isso me faz mal - gosto/não gosto - concordo/não concordo - quero assim/não quero assado - o meu é melhor/o teu é pior - do particular ao geral é nesta dança do eu/meu versus teu/seu que são cometidas as maiores atrocidades na história da humanidade, tanto no âmbito privado quanto no coletivo. E começa assim, o individual descontente que soma a outro individual descontente e que, quando vemos, lá estão os dois lados se dIgladiando em nome daquela mentira que cada um pensa ser verdade. E tudo fica reduzido a este patético e nada criativo conflito alimentador dos egos cada vez mais inflados de suas "verdades" – dane-se o bem estar do vizinho, da vila, da cidade, do pais, do planeta, da humanidade - eu quero provar que estou certo e os outros errados. Assim tem vivido nossa humanidade e é disso que tem se alimentado: conflito, conflito, conflito - e o final é sempre o mesmo: a banda "boa" achando que destruiu o mal, a banda "podre". No final saem todos perdendo, sofrendo. Esta é a fórmula tida como de sucesso e de evolução que a humanidade tem vivido e acreditado como certa. É assim que nossas sociedades tem se comportado e "crescido". E na periferia dela, da humanidade, a fome, a violência, a injustiça, a dor, a magoa, o ressentimento, a revolta.

Faço estes apontamentos, assim tão enfáticos e abrangentes, buscando comunicar a visão que tenho do quanto o sofrimento vivido por nossa humanidade tem seu gérmen no seio da parcial insatisfação individual. Estas insatisfações são nascidas do ego, do eu que precisa sobreviver preservando a identidade que ele acredita ser a sua; bastião de sua segurança e sobrevivência física, emocional e psíquica.

Quanta guerra cotidiana eu testemunho entre os que me são próximos. Quanta voracidade em seus pensamentos e emoções. Quanto desgaste na constante luta para afirmar a existência de suas identidades. Eu também percebo isto em mim, e é terrível, cada vez mais terrível observar a existência e o poder deste "ser" inventado pelo meu "senso de identidade", e que não sou eu - é uma espécie de tirano que rouba quem somos e coloca no lugar um zumbi automatizado pelas engrenagens mais prosaicas dos pensamentos nascidas das memórias medrosas, egoicas, ambiciosas. Ver este terrível zumbi atuando em mim faz com que eu enxergue claramente a fonte dos conflitos e, desta forma, consiga refletir: ok, este é o zumbi - ok, este sou eu - ok, posso optar entre ele e eu - e cada vez mais opto por quem sou e não pelas memórias psicológicas que tenho da vida, dos outros e de meus medos e prazeres. Quanto mais percebo a atuação do zumbi em mim, mais o desmascaro. Quanto mais o desmascaro, menos poder ele tem de obscurecer quem sou. É um exercício muito simples: tomar consciência apenas - isto já basta, pois vou me dando conta que me é possível estar consciente de que estou consciente - uma benção para mim, um horror para o zumbi.

Todos nós, de acordo com cada vida e contexto, desenvolvemos um olhar sobre como deveriam ser as coisas, e este olhar deve ser respeitado como elemento que compõe a construção do todo, e não utilizado para determinar, individualmente, como as coisas devem ser, segundo valores que no fundo são apenas pessoais. Os integrantes de um grupo, que optaram por construir juntos este grupo (comunidades, raças, credos, povos), necessitam compreender a existência dos dois níveis: pessoal e coletivo, e que o pessoal só cresce, melhora, amplia, se o coletivo (a cultura) cresce, melhora, amplia.

Isto que escrevi não deixa de estar baseado em minhas idiossincrasias e é uma visão pessoal de como as coisas deveriam ser. Mas acredito que há aqui um elemento que talvez ainda não tenha comunicado completamente, e para o qual usarei uma imagem conhecida da humanidade a vários milhares de anos: enquanto farinha, óleo, água, sal, açúcar e fermento não quiserem abrir mãos da existência de suas identidades próprias, não haverá pão. Como a vida quer pão, ela mistura tudo, sova, deixa crescer, sova novamente e põe no fogo - e ela faz o pão sem se preocupar com a preservação do "senso de identidade pessoal" dos elementos que o compõe. Ao contrário, a ela apenas interessa a identidade que terá o pão. Tem pão que fica delicioso. Há alguns que ficam ruins. O delicioso, a vida compartilha e come, alimentando e fortalecendo. O ruim, a vida lança na lata de lixo e sequer lembra que não ficou bom. E lá ficam farinha, água, óleo, fermento, sal e açúcar se decompondo, fazendo sentido apenas os micro-organismos, vermes, moscas e congêneres - o que também é um serviço prestado à vida, mas... venhamos e convenhamos...

Que espontânea alegria eu percebo em mim ao me dar é na direção de fazer parte o pão delicioso, para ser compartilhado. Não deixo de ser farinha ou água ou fermento, etc., e não quero que os outros elementos deixem de ser o que sejam, mas o que sou e o outro é só tem sentido se compõe para o alimento. Caso não, tristeza, frustração e alimento para o zumbi, que se fortalece e volta a tomar conta, com toda a sua verborragia vitimoza e convicta de que no outro o inimigo está sempre prestes a se revelar.


To com fome e quero pão do bão!

terça-feira, 23 de abril de 2013

SOLIDÃO HUMANA




Ultimamente, antes de mergulhar nas ondas, vagas e tsunamis vindas dos diversos (na maioria das vezes 2) lados de uma questão levantada pela mídia como verdadeiro bastião da discórdia,  promovendo indignações de lá e de cá, pergunto-me: a que responsabilizar por isto? Uso o pronome "que", posto que acredito alguns ou muitos quens só poderem ser um "o que", uma coisa, uma organização, uma instituição, uma classe, uma tribo, gueto, comunidade... com uma boca enorme, uma língua frenética e muito, muito pouca eficiência cerebral e valorosidade cardíaca 

Ninguém tem razão e todos têm razão. Na contenda entre as razões, seus pífios e inflamados guerreiros investem um contra o outro até a morte de um deles - com direito a colocar o pé em cima e urrar a vitória. Da luta, o resultado? Apenas vencer! Daquilo que se defendia, os resultados? Mais guerra, claro!, pois sempre haverá a "família" e os confrades do morto X a família e os confrades do algoz (vencedor)! Ah, e tem também a legião de indignados, que, temerosos de que o conflito invada seus doces, confortáveis e seguros territórios, passam a bocarrar e linguadibnar muito mais do que aqueles mais próximos ao fato em si. E assim vamos construindo nossa civilização e sociedades, apenas mais sofisticadas e complexas, mas tão próximas, na reação de seus íntimos, àqueles que os cultos e civilizados chamam de primitivos ignorantes.

E eu me perguntando: O que responsabilizar por isso? A resposta não surge, mas sou acometido por um olhar grande e longo, que, num átimo, e sob a égide de uma capacidade misteriosa de síntese, coloca sob minha visão a história toda desta nossa tão cara humanidade; o tempo de vida possível para cada indivíduo humano, em contraponto ao tempo de existência da humanidade; a soma incalculável de todos os que desde o advento do homem na Terra já viraram pó (ou cinzas); os todos de nós em seus cotidianos neste exato momento; os poucos considerados grandes e influentes emparelhados com enorme massa de comuns viventes; as revoluções; as chamadas conquistas do pensamento humano; a quantidade de coisas já feitas pelas mãos de cada um dos bilhões de seres humanos de todos os tempos, seus orgasmos, suas sempre mesmas trajetórias físicas, que vão do feto ao cadáver inevitável...

Sinto peso e tristeza. Afundo levado pela âncora amarrada no centro de meu cérebro. A corda que a amarra? O esforço para encontrar uma explicação e uma saída. Fico sem ar, debato-me contra as paredes de minha caixa craniana. Sem ar e sem forças, sei que irei morrer. Desisto. Aceito a morte que chega. Entrego-me.

Subitamente meus sentidos me chamam e eu me dou contas das coisas em meu estúdio, dos sons que chegam da rua, do vento que entra pela janela, do cheiro e do sabor dos amendoins que eu estava comendo sem sequer ter me dado conta de como vieram parar em minha mão. Então não morri? Morreu!, um pensamento me diz. Pois bem, então morri, mais uma vez. E fui ler o que escrevi aqui. E me dei conta de que em momento algum a Natureza teve participação em minha visão. Só havia gente, homens, humanidade. Afora estes, nenhum outro animal, ou vegetal ou mineral. Sem terra, sem fogo, sem água, sem ar. Sem montanhas, planícies, vales, mares, oceanos, lagos, nuvens... Ah, de quanta solidão a humanidade se cercou! 

E foi assim que a resposta se me deu!