Algumas pessoas, em algum momento da vida, ouviram o galo
cantar e ficaram fascinadas com a beleza do canto. Muitas delas intuíram que
aquele canto anunciava o amanhecer de algo novo, de uma verdade ainda não
revelada.
No intuito de encontrar esse algo novo, foram em busca de
onde o galo cantava, certas de que ao encontrar, ali a verdade seria reconhecida
e conquistada.
Em meio à longa, cansativa e frustrante busca, começaram
a perceber que não havia tal lugar.
Muitas desistiram, empalidecendo por dentro. Outras, as
mais aguerridas às imposições de suas visões, não me perguntem o porquê, passaram
a elucubrar um local fictício, um galinheiro apropriado para o canto do galo,
onde elas, travestidas de galinhas-mães, seriam intérpretes da mensagem contida
no canto.
Pobres! Tornaram-se convictas de o serem.
Reuniram informações e conhecimentos e os organizaram de forma
a tramarem um raciocínio lógico que embasasse e justificasse suas
interpretações. Idealizaram normas, regras e cartilhas. Em seguida, ninhos,
poleiros e cercados foram inventiva e cuidadosamente criados para receber a
galinhada que certamente se multiplicaria.
Nesses lugares nunca se ouvia o canto do galo, mas todos acreditavam
em sua existência. Viviam a imaginar como ele seria. Almejavam a benesse de
algum dia ouvi-lo e serem salvos por ele. Trabalhavam incansavelmente para que
a “verdade” se solidificasse no mundo, assim como lhes fora ensinado nos
poleiros desde a mais tenra idade.
Hoje, vez ou outra, uns frangos, ou frangas, ouvem um
canto de galo que lhes encanta mais do que toda a entediante velha falação. Sem
se dar conta de que o canto é o canto, por si e em si, lá vão os neófitos conquistadores
da verdade fazer cumprir, por pura inércia educacional, a trágica sina.
Quantos galinheiros diversos no mundo. E como aumenta os
decibéis do alarido de seus cacarejares uns contra os outros. E também o sangue
nos bicos, espora e penas.
Ainda se ouve o canto do galo em cada alvorecer, mas
longe, muito longe, cada vez mais longe.